Hoje eu comi um Bauru de verdade

by Zeh on April 23, 2009

No artigo anterior sobre trabalhar em casa eu disse que comer fora, num lugar legal, acabava perdendo o sentido quando você trabalha sozinho.

Bom, é verdade, quando você trabalha em casa não tem mais aquela coisa divertida de ir comer na churrascaria toda última sexta-feira do mês, ou fazer um almoço mais longo só pra comer num lugar legal específico, ou num lugar mais caro só porque é dia do pagamento. Não faz tanto sentido se você vai sozinho e não tem com quem compartilhar aquele momento gastronômico solene ou o almoço de 3 horas reservado especialmente pra estragação financiada pelo chefe.

Mas acho que menti um pouquinho. Pelo menos no meu caso, mesmo trabalhando em casa, acabei sim criando alguns costumes gastronômicos vagamente relacionados ao trabalho. Basicamente, após cada trabalho que faço que vai pro ar, tomo um gole da Vodka Absolut de baunilha que ganhei da Gringo há um tempão atrás (valeu!); e sempre que efetivamente recebo um pagamento, vou comer num lugar legal pra comemorar. Nada super chique, só um lugar que eu goste, talvez meio fora de mão, talvez um lugar que não visito há muito tempo, etc. Não é nada tão bom quanto trabalhar num escritório – onde é mais fácil você ir comer num lugar diferente a cada dia – mas é alguma coisa.

No final do mês passado recebi um pagamento por um trabalho que fiz mas, devido à correria de outro trabalho que estava terminando, nem pude ir no banco transferir a grana pra minha conta (como recebo de fora do país, sempre tenho de ir no banco fazer o pedido de transferência do câmbio). Finalmente fui lá hoje, com o dólar num lindo palíndromo (2.22000222), e saindo do banco, decidi dar início a mais uma instância deste importante ritual alimentício. Como meu banco é perto da Praça da República, resolvi dar uma volta no beco da memória e ir comer no Ponto Chic, que fica no Largo do Paissandú (atrás da Galeria do Rock, perto da Praça do Correio).

Pra quem não conhece, o Ponto Chic é um bar/restaurante/lanchonete super antigo de São Paulo (com várias filiais pela cidade, mas este do centro é o original). Fundado em 1922, é um lugarzinho meio cult embora não seja, assim, nada de mais visualmente. É também onde foi inventado o Bauru.

Bauru do Ponto Chic

A principal razão de eu ter ido lá é porque este é um lugar que costumava ir bastante com meus pais quando eu era mais novo (no final da década de 80), em nossas inúmeras andanças pelo centro, então tenho boas memórias do ponto. E também gosto bastante do Bauru que eles fazem. Costumo ir lá esporadicamente, mas já faziam uns 4 anos que eu não visitava o lugar.

Sempre que vou lá, é um momento meio agridoce: legal repetir o mesmo ato que realizei décadas atrás, mas meio chato ver como o lugar mudou. Aquela coisa meio nostálgico-bobalhão.

Entrando no restaurante hoje, já tive um choque: razoavelmente lotado, todo mundo comendo… comida. Comida normal. Tipo grelhado e tal. Pô, pra mim o lugar é lanchonete, gostava de ir lá e comer Bauru e Banana-split. Mas, pelo menos naquele horário – deviam ser umas 2 ou 3 da tarde – o lugar era um restaurante normal.

O que é meio triste é pensar que, até pela localização, o lugar tem de se adaptar. Não é um lugar da moda: é no meio do centrão. Não é mais ponto de encontro de intelectuais nem nada do tipo. Imagino que não tenha muita coisa do lado que justifique uma clientela assídua, nem muitos atrativos especiais pro lugar, até porque já tem choperias mais badaladas por perto. Então não dá pro lugar sobreviver só na base da memória. Até o nome hoje soa meio esquisito, quase um eufemismo. Então acho que ninguém devia estar lá pelo que o lugar oferece de diferente, mas sim por ser mais um lugar normal pra comer.

Cheguei, sentei. O garçom que veio me atender era um cara um pouco mais de idade, e provavelmente um veterano do restaurante. Recusei o cardápio, e, resoluto, pedi um Bauru logo de cara.

Posso estar errado, mas acho que percebi um brilho em seus olhos.