Variações da palavra impressa
by Zeh on July 6, 2011
Há uns meses atrás, tipo o prazer de ser presenteado pela Meagan com uma assinatura da revista Wired. Eu já tinha lido vários artigos da revista (a maioria online) e até comprava ela às vezes no Brasil quando algum assunto específico me interessava, então já conhecia bem a publicação.
No entanto, uma coisa que eu não andava fazendo muito desde que me mudei pra Nova York era ler publicações impressas com muita frequência. Foi isso que esse presente me deu a oportunidade de fazer gastar um tempo lendo uma revista, todo mês, de forma consistente, ao invés de artigos esporádicos indicados por algum amigo ou algum website.
Assim, ler a Wired todo mês me fez acordar pra algo que, de certa forma, eu já sabia, mas não tinha muita idéia da escala: revistas Brasileiras são, em sua maioria, um lixo imenso.
O que me surpreendeu é que, sem exceção, a cada número da Wired que eu encontro, 90% das matérias (por mais esdrúxulas ou aleatórias que sejam) são matérias que me despertam o interesse. Mais do que isso, as matérias não são superficiais (a maioria é extremamente longa), nem tampouco ofendem a inteligência do leitor por tentarem passar opinião como fato – o conteúdo editorial é, em sua maioria, bastante neutro, de modo a deixar o leitor tomar suas próprias conclusões. São matérias que me ensinam algo novo, ao invés de tentar me vender alguma coisa ou repetir algo que eu já sei.
Em suma, o que me deixou surpreso é o quanto minha apreciação da revista é consistente, mês após mês.
Especialmente se eu comparo isso com qualquer outra publicação das que eu lia quando estava em São Paulo.
Infelizmente, isso é um pouco como comparar laranjas com maçãs, dado o fato de que não existe um equivalente à Wired no mercado Brasileiro. Mas a impressão que me dá agora é que revistas publicadas no Brasil sempre estão ou tentando atingir o mínimo denominador comum, ou estão com uma agenda própria que ou ofende quem lê, ou repete o que o leitor já pensa com uma retórica digna de segundo grau (caso da revista com maior circulação no Brasil).
Existem exceções. Lembro de ter lido algumas edições da Revista Web Design (precursora da Revista Wide) e fiquei surpreso com a qualidade editorial, dado o mercado restrito que a revista visa atender; a Superinteressante parece estar voltando às origens e trabalhando pra manter a inteligência de seus leitores ao invés de drená-la com matérias escritas pra serem copiadas em trabalhos de escola na sexta série; e a Piauí, pelo que me disseram, é muito boa. Mas ainda assim, eu não consigo me lembrar de nenhum momento em que eu terminei de ler uma revista inteira e, ao fechar a publicação, disse pra mim mesmo, “cacete, essa revista é boa pra caralho“.
Já com a Wired eu faço isso toda hora.
E não é só a Wired. A Time e até mesmo a Fast Company são revistas que leio de vez em quando só porque alguma matéria me atraiu e termino surpreso com a qualidade editorial.
Obviamente que existem revistas escrotíssimas nestas terras. Mas não são a maioria das mais vendidas do país, como parece ser o caso no Brasil.
Falar isso dessa forma é meio foda e me dá um certo nó na garganta. Fico imaginando que alguém vai ler o artigo e me chamar de traidor nos comentários. Dá aquela impressão de que estou falando “Nosssa, mas os gringos são muuuito melhores“. Não é o que penso, mas é o que o mercado editorial Brasileiro me parece, agora, em comparação, depois de dois anos exposto aos títulos locais.
Isso me traz ao segundo ponto deste artigo: capas de revistas.
Isso é outra coisa que comecei a prestar atenção há alguns anos. Quando eu trabalhava na Grafikonstruct, parava sempre pra comprar quadrinhos numa banca de jornais em frente ao Conjunto Nacional. Lá eles têm muitas revistas importadas (as mesmas Newsweek, Time, Wired, e mais alguns outros títulos distribuidos ao redor do mundo) e vendo elas todas reunidas num canto, era gritante a disparidade entre a qualidade das capas das revistas gringas em comparação às equivalentes nacionais.
Um exemplo, da capa mais recente da Wired:
Composição simples: a matéria principal da revista ganha o foco (ilustração bem bacana, aliás). Elementos adicionais são mostrados no topo, mas sem tentar chamar a atenção demais. A tipografia é consistente e o peso determina a importância. Nada muito gritante. Não é a melhor capa que eles já fizeram, mas é uma boa capa.
Uma capa da Veja:
Mais uma das capas onde eles querem fazer teatrinho e fazem algum tipo de foto-montagem com atores pra matéria principal, que é explicada sempre com um bloco de texto enorme, onde há pouca distinção entre título e corpo; pior, sempre listando itens da matéria de uma forma que tenta ser didática, mas que acaba dando a impressão de que a capa foi feita no Power Point. Itens adicionais no topo brigam pelo espaço e todos têm sua própria foto.
Não é pior capa que a Veja já fez, mas é bem ruinzinha.
Vejam esta comparação, desta vez entre Time e Veja, mas ambas cuja matéria principal é meio relacionada (conflito de gerações – embora um seja do ponto de vista comercial, e o outro, do ponto de vista político):
A capa da Veja não tem peso nenhum – tudo tem o mesmo foco. Tampouco existe qualquer contraste de cor; tudo é extremamente colorido. A capa da Time, coincidentemente, lista pontos da matéria, mas usando o peso e espaçamento para distinguir entre cada item; ela não precisar fazer de conta que é um slideshow e colocar pontos no início de cada parágrafo.
Outra coisa que fica óbvia com essas capas: ambas a Time e a Wired listam os autores das matérias principais na capa. Muito frequentemente, é alguém de respeito. Já as matérias da Veja são escritas, sei lá, por alguma entidade desconhecida.
Quando veríamos uma capa destas numa Veja?
Espaço em branco? Mas nem que a vaca tussa. O equivalente Brasileiro seria algo assim:
Muito mais colorido. Fotos de capa inteira. Um gradiente desnecessário. Texto listando os pontos (óbvios) da matéria. Ordem de leitura visual questionável. Chamadas não relacionadas, mas com muito mais ênfase, no topo. Caixa alta em tudo.
Obviamente, isso tudo leva à… capa da Veja São Paulo comemorando os 447 anos de São Paulo:
É uma capa que tem tanta coisa errada que bate uma tristeza imensa mais do que uma raiva. Algo que deveria ser especial – 457 anos da cidade, porra – é celebrado, ao invés, com uma das piores capas que a revista já fez (a Veja São Paulo não é exatamente brilhante com suas capas, mas tem discernimento pra acertar, às vezes).
O mais triste disso tudo – evidenciado por posts como esse e esse e seus comentários – é que nada disso importa. As capas são, sim, horrendas se você tenta julgá-las sob o ponto de vista crítico de design – mas ninguém liga, porque ninguém percebe, ou pior, acha que tentar se preocupar com o design de algo é ser intelectualóide.
Sei lá. No final das contas, esse é mais um post reclamão. Nada muito edificante.
Mas há um tempo atrás tomei a decisão de ir postando aqui minhas impressões da cidade e da cultura local conforme o tempo, e é inevitável que essas comparações aconteçam; e quando elas acontecem, prefiro escrever aqui do que ignorar o óbvio só pra ficar no super positivo.